sexta-feira, 20 de maio de 2011

O fim [de tarde] (Américo Cavalcante)

     
            17h30. Ele estava sentado na grama embaixo de uma árvore, lendo o texto com uma falsa concentração, enquanto o sol se punha espalhando vermelho onde há pouco tempo só havia azul celeste. Seus olhos quase não mexiam, vagando apenas entre a primeira linha no papel e a linha do horizonte, como se o tempo tivesse perdido o ritmo no momento em que ele lembrou as últimas palavras que a ouviu pronunciar:

“Por favor, não!”

        Ele sabia que o fim de um relacionamento não era algo fácil, mas não imaginava o quão difícil seria na prática. Não estava conseguindo esquecer aquelas súplicas que ecoavam em sua mente enquanto tentava ler o maldito texto. Faltava pouco tempo para a prova, mas até o barulho do vento roçando nas folhas da árvore tiravam-lhe a concentração.
            Desde as 16h00 ele estava entre a linha do horizonte e a primeira linha do texto, misturando palavras difusas e borrões vermelhos. Tudo parecia condená-lo, mas ele não podia se arrepender. Mais uma vez ouviu a voz dela ecoar:

“Por favor, não!”

            Inspirou lentamente, tentou apagar a lembrança ao expirar o ar quente. Sua respiração falhava com o tremor do seu corpo. Ele dobrou o papel, colocou-o ao seu lado e tentou refletir sobre o que viveu nos últimos três meses. “O amor é um sentimento confuso que nos rouba o norte. Como saber senti-lo?” Ele já não conseguia discernir seus pensamentos, seus sentimentos. “Afinal, porque tudo se dissipou em tão pouco tempo? Aquela atitude foi precipitada?” Estava tudo acabado e ele não conseguia estudar para a prova. O pouco tempo que restava foi preenchido pela voz dela:

“Por favor, não!”

            Sentiu pena. Um pouco de arrependimento, talvez. Aquele pedido de cortar o coração se repetia cada vez mais alto. A voz dela martelava em sua cabeça. Não conseguiria mesmo fazer a prova. A rejeição que sofreu da mulher que amava ocupou todo o espaço que tinha em mente. Os últimos três meses foram os melhores da sua existência, mas tudo o que restou foi a certeza de que estaria ferrado na prova e teria aquela voz como lembrança eterna da mentira que viveu intensamente.

“Por favor, não!”

            Seu olhar vagou da linha do horizonte, que sumia com os últimos contornos da tarde, para as suas mãos, iluminadas pelo reflexo do crepúsculo. Ele limpou o vermelho dos dedos trêmulos na grama, guardou o texto e, decidindo não fazer a prova, foi embora com o sol.

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